Silos de carregamento de vagões do Projeto S11D. Foto: Reprodução/jwservice.com.br

Nos municípios de maior arrecadação da Compensação Financeira por Exploração Mineral do Brasil, as condições de vida da população são precárias

Por Larissa Rabelo Nunes e Dioclécio Soares Gomes, do Coletivo Nacional de Comunicação MAM

Os estados do Pará e de Minas Gerais, principais exportadores de minério do Brasil, possuem municípios com grande arrecadação via Compensação Financeira por Exploração Mineral (CFEM), porém o recurso não tem uma destinação ideal e os moradores pouco têm acesso aos trâmites que correm em torno dessa verba pública mineral.

Estabelecida em 1988, na formulação da nova Constituição brasileira, a CFEM é uma contraprestação paga mensalmente pelas mineradoras aos municípios minerados, justamente para motivar outras formas de economia para além da mineração e investimentos públicos que alcancem a população em geral.

No ano de 2020, o município de Parauapebas (PA), campeão de arrecadação no Brasil, recebeu R$ 1.534.894.165. Na segunda colocação, a também cidade paraense Canaã dos Carajás, que abriga o S11D, mais volumoso projeto de exploração de minério de ferro da Vale no mundo, faturou R$ 1.198.5901.114. Já em Minas Gerais, também pela exploração de minério de ferro realizado pela britânica Anglo American, a cidade que mais recebeu a CFEM foi Conceição do Mato Dentro, arrecadando R$ 358.363.635, seguida por Congonhas, que viu entrar nos cofres públicos do município R$ 264.354.059.

Falta de transparência no uso da CFEM

O estado do Pará tornou-se o maior exportador de minério nessa segunda década do século 21 e isso não melhorou a qualidade de vida dos paraenses. Segundo dados da renda per capita mensal do Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que é obtido pela média entre a divisão do Produto Nacional Bruto (PNB) pelo número total de habitantes, o estado aparece em 5° lugar no ranking de 2019 na classificação de pessoas em condições de pobreza e extrema pobreza.

Na cidade mais minerada no estado, Parauapebas, a população conta com apenas 45,7% de seu esgotamento sanitário adequado e somente 27,3% dos moradores do município tem emprego formal. Para Giliad Silva, professor de Economia da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) e coordenador do Projeto De Olho na CFEM, o dinheiro arrecadado percorre por caminhos errados dentro do erário público. “Os municípios colocam a arrecadação da CFEM em conjunto com recursos ordinários, deixando tudo em um ‘caixa único’. Isso é um grande prejuízo à transparência dos recursos públicos”, explica.

ERÁRIO PÚBLICO | É o dinheiro que o Governo dispõe para administrar o país, é o conjunto de bens, composto pelos recursos financeiro, tesouro nacional etc.

O projeto De Olho na CFEM é uma iniciativa do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração, em conjunto com Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e o Grupo Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade (PoEMAS), e visa fiscalizar a arrecadação em seis dos principais municípios mineradores do Brasil – Canaã dos Carajás (PA), Parauapebas (PA), Marabá (PA), Alto Horizonte (GO), Conceição do Mato Dentro (MG) e Açailândia (MA). Giliad pontua que a Compensação é um orçamento como o do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e que, portanto, “precisa ter um ‘caixa’ próprio do seu recurso para ter uma melhor fiscalização de seu uso”.

Em Minas Gerais não é diferente. Na pacata Conceição do Mato Dentro, metade da população não acessa o saneamento básico que atinge aproximadamente 46,4% das moradias, segundo dados do IBGE. “As regiões que poderiam ser beneficiadas pela renda da mineração são as que mais sofrem. Portanto, elas são incapazes de proporcionar a plena cidadania dos indivíduos que têm as jazidas exploradas em seus municípios”, afirma Charles Trocate, membro da coordenação nacional do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM).

Assim, a arrecadação da CFEM acaba sendo utilizada para outros fins que não chegam à população. “Isso é problemático porque impõe à compensação prerrogativas que não são dela. A CFEM não existe para ‘compensar’ impacto ambiental. Quem tem que compensar o impacto ambiental é a empresa exploradora dos minérios”, reforça Giliad.